
Abrir uma holding virou tendência entre os empresários — mas será que vale para todo mundo?
Se você é contador, empresário, advogado ou administrador, com certeza já ouviu falar sobre holdings, mas embora a modalidade tenha virado tendência e caído no gosto de muitos para fazer o planejamento sucessório e proteger seu patrimônio, essa pode não ser a solução para todo mundo.
O especialista em planejamento sucessório e patrimonial, negócios e reestruturações societárias no Rücker Curi Advocacia e Consultoria Jurídica, Matheus Kniss, esclarece como começou a tendência das holdings, o motivo da popularização e pontos de atenção. Confira abaixo e entenda melhor tudo sobre essa modalidade.
Segundo o especialista, a popularização da holding tem raízes em dois fatores principais:
- A promessa de economia tributária: durante muito tempo, vender a ideia de que uma holding “paga menos imposto” foi uma forma fácil de atrair interessados. Em alguns casos, isso até fazia sentido. Em outros, era apenas uma meia verdade — ou uma armadilha;
- A busca por controle e organização familiar: famílias com patrimônio relevante começaram a procurar formas de evitar brigas entre herdeiros, facilitar a sucessão e manter os bens “em casa”. A holding apareceu como uma solução prática, com aparência de sofisticação e segurança, importada de modelos adotados em outros países.
O problema da receita de bolo
“O instituto da holding sempre foi muito utilizado lá fora — e acertamos muito ao trazê-lo para cá”, esclarece Kniss.
Todavia, o que era para ser uma ferramenta estratégica virou uma solução genérica. Muita gente começou a oferecer “pacotes prontos” relacionados à holding, sem entender o contexto de cada família, avaliar riscos ou explicar as consequências jurídicas e tributárias envolvidas.
“Como resultado, houve quem pudesse se beneficiar de reduções de ganho de capital na venda de imóveis, por exemplo, e que acabou desperdiçando a oportunidade por ter integralizado em uma holding um imóvel que não deveria ter sido integralizado. A decisão, padronizada, acaba elevando os custos tributários para essas vendas, por nunca ter valido a pena, sem falar em outros custos que não seriam necessários em determinadas situações”, pontua o especialista.
Ele levanta um ponto importante para reflexão: “falta questionar: será que você realmente precisa de uma holding?”
“Antes de abrir uma empresa para “organizar o patrimônio”, é preciso fazer uma pergunta mais importante: qual é o seu objetivo? Evitar o inventário, isolar riscos empresariais ou prevenir conflitos familiares? Ou apenas e tão somente fazer o que todo mundo está fazendo?” questiona Kniss.
Ele continua: a holding é útil, e não estamos aqui para demonizá-la. Pelo contrário. “Queremos que você pense se esse instrumento faz sentido dentro de um planejamento maior e principalmente se ele serve para você”
O que é, de fato, uma holding?
A palavra holding vem do inglês to hold — que, em tradução livre, significa “segurar” ou “controlar”, a depender do contexto. “Dentro da ideia do planejamento patrimonial, sucessório ou empresarial, é, apelando para a redundância, uma empresa criada para controlar bens ou outras empresas”, inicia Kniss.
Geralmente, chamamos de patrimonial a holding criada para concentrar imóveis, investimentos e outros bens, e empresarial a usada para controlar participações em outras empresas.
Em outras palavras, a holding patrimonial gerencia bens e investimentos, e a holding empresarial gerencia ações ou quotas de um (ou mais) sócio ou acionista em uma outra empresa.
“Agora vamos desmistificar algumas coisas. É importante que você saiba que a holding não é uma forma automática de pagar menos imposto, nem de blindagem infalível contra dívidas. Porém, nossa maior preocupação é que você saiba que a holding não é uma solução pronta para qualquer família”, alerta o especialista.
Ele ainda pontua que, criar uma holding sem planejamento pode gerar custos, burocracia e até problemas tributários. É como comprar uma casa sem saber se você vai morar nela, alugar ou vender.
O que mudou em 2025: novas regras, novos cuidados
Com a Lei Complementar 214/2025, que implementa a primeira fase da Reforma Tributária, o cenário mudou — e muito. A princípio:
Nova carga tributária para holdings patrimoniais que exploram imóveis (locação, cessão, arrendamento).
- Fim de algumas isenções e restrições ao uso de créditos tributários;
- Regime de transição até 2033, com alíquotas reduzidas;
- Imposto de doação progressivo até o limite de 8%, embora a maioria dos estados ainda não tenha aderido à mudança.
“Trocando em miúdos: a holding ainda pode ser vantajosa, mas continua exigindo tanto cuidado quanto antes. O que antes era oferecido uma “economia certa” continua dependendo de planejamento, prazos e contratos bem estruturados, e com certeza não existem modelos prontos, ainda que destinados a famílias ou empresas semelhantes.”
Existem outras opções?
O especialista esclarece que existem sim outras opções além da holding. “Não só outras opções, como alternativas que, muitas vezes, podem ser mais simples, mais baratas e mais eficazes”, diz Kniss.
- Doação com reserva de usufruto: transfere-se o bem em vida, mas mantém-se o controle e o uso.
- Testamentos: permitem organizar a sucessão com cláusulas específicas. Em certos casos, podem ajudar em casos de invalidez (diretivas antecipadas de vontade).
- Fundos fechados: usados para concentrar investimentos com regras próprias (também sofreu impacto tributário por alterações legislativas recentes no Brasil).
- Seguros de vida: com cláusulas estratégicas, podem ser usados para equalizar heranças ou proteger dependentes.
“Cada uma dessas ferramentas tem vantagens e desvantagens. O segredo está em combinar soluções, não em apostar tudo em uma só”, revela o especialista.
Em resumo: planejamento não é moda, é estratégia
“A holding é útil? Sim. Ela serve para você? Não necessariamente”, elucida Kniss.
Ele ainda sugere que, qualquer que seja o caso, que você não se encante com modelos prontos ou pacotes padronizados. “Não faz nenhum sentido que seus bens, sua família e seus negócios sejam tratados como quaisquer outros. Pelo contrário: um bom planejamento só faz sentido se estiver alinhado com as suas expectativas e respeitar as particularidades e filosofias e os princípios valiosos para você. Se não, com toda a honestidade, convém manter as coisas como estão”.
Ele continua: “apelando para a sinceridade extrema: não há receita de bolo. Tudo que tem a ver com esse tema é um processo que exige ouvir, analisar e avaliar estratégias. E, acima de tudo, exige que você entenda o que está fazendo — e por quê.”
“Uma vez mais, o objetivo não é desincentivar o uso da holding. Talvez, no fim, a holding seja mesmo o melhor caminho. Mas talvez não. E se não for, esteja absolutamente tranquilo: outros instrumentos podem te atender tão bem quanto uma holding. Talvez até melhor”, finaliza Kniss.
Com informações Matheus Kniss e Agência Literal Link